O estilo mogol, na arte e na arquitetura, não tem autor particular ou grupo de artistas criadores. Resulta de uma consciente atuação de imperadores – desde Babur, o fundador do império mogol – até Humayun, mais Akbar, Jahangir, Sha Jahan, Dara Shikoh e Aurangzeb, gente que compartilhava grande interesse pelas artes, além de serem líderes de um império que cobriu grande parte da Índia em seu auge. Homens cruéis, por certo, guerreiros conquistadores, senhores das guerras. Comandavam bravamente invasões e o domínio de povos mas, ao mesmo tempo, eram apreciadores das artes, ciência, astronomia, filosofia, literatura e religião.
A dinastia muçulmana – de origem mongol-turca – que governou a maior parte do norte da Índia desde o início do século XVI até meados do século XVIII, foi notável pela habilidade de seus governantes, que através de sete gerações demonstraram talentos incomuns, da organização administrativa ao comando, sendo a mais estranha aos dominadores, a dedicação, ainda que muçulmanos, de integrarem-se com os hindus para formarem estado indiano unido.
Incentivando e promovendo diversas expressões artísticas, não apenas na arquitetura e na ornamentação, mas na pintura e literatura, todavia principalmente naquelas, por 250 anos financiaram gerações de arquitetos, artesãos, calígrafos, artistas, pintores, escultores, metalúrgicos, tecelões, resultando num estilo esteticamente sutil, delicado e elegante, ainda que robusto e grandioso, às vezes monumental, massivo apenas para expressar poder e glória. Era a grandiosidade artística como instrumento de demonstração de poder.
Sempre que possível, respeitavam os padrões islâmicos cujas bases estavam na Pérsia, mas inspiradas e consumadas por Tamerlão durante o império mogol de Samarkanda, Uzbequistão, de tal maneira que as primeiras construções mogóis na Índia sejam interpretadas estilisticamente como meras recriações do estilo timúrida de Tamerlão, embora da arte persa, da corte safávida de Isfahan, tenha-se originado, contudo, mais tarde, tendo adquirido na Índia sua personalidade e desenhos muito próprios. Talvez por isso os persas desprezassem as cortes islâmicas da Índia, que definiam os mogóis como gente de um senso estético que não lhes agradava, tendo sua arte sido influenciada demais pela hindu, se “arredondado” demais e tornado menos brilhante e colorida que a expressa nos mosaicos cerâmicos persas e timúridas.
Carecia, diziam aqueles, de classicismo, de contenção, estavam longe da perfeição geométrica da safávida, ainda que inconfundível, de notável individualidade e de um bom gosto irretocável aos olhos do resto do mundo. Mesmo um não conhecedor, depois de uns dias na Índia, dificilmente deixará de reconhecer que aquele monumento ou trabalho pertence ao período mogol, sejam os expressos nas fachadas e ornamentações internas, sejam os demonstrados em minuciosas pinturas de cenas do império e nas artes decorativas, tal sua distintiva personalidade.
Uma obra prima arquitetônica que quase consagra toda a perfeição e beleza do estilo mogol, o imenso mausoléu de Humayun, ainda que este seja apenas um dos exemplos da fabulosa arte voltada à arquitetura, mesmo em Delhi, onde, por exemplo, a mesquita Qila-I-Kuhna, dentro da cidadela de Purana Qila – ou Old Fort, chega à perfeição. Este túmulo, declarado Patrimônio Mundial pela UNESCO, em 1993, foi obra desenhada por arquitetos de Bukhara, no Uzbequistão, a pátria timúrida, dinastia da qual os mogóis são extensão. É comum apelidarem o túmulo de Humayun como “Taj Mahal de Delhi”, embora haja enormes diferênças entre ambas, todavia, a magnífica necrópole – em cujo silêncio sereno de suas pedras cor-de-rosa Humayun repousa em paz – também pode ser uma prova de amor.
O quinto imperador mogol – Shah Jahan – talvez seja o personagem mais romântico da Índia, pois construiu o Taj Mahal, o mais espetacular túmulo do planeta, monumento em memória de sua esposa, Mumtaz Mahal,. Merece o título, não há dúvidas, mas poucos sabem que sua inspiração veio de sua bisavó, Hamida Banu Begum, esposa do segundo imperador mogol, Humayun que, dizem, construiu a Tumba de Humayun, o primeiro do subcontinente indiano cercado por um jardim – o Char Bagh – que também impressiona pela megalomania, pela demonstração de poder e pelo que deve ter sido a vultosa soma de dinheiro empregada ali, onde não se encontra ângulo imperfeito ou canto que não impressione.
A seguir:
Capítulo 5 – O Complexo Arqueológico Mehrauli
Belíssimo relato Arnaldo, que imagino seja fruto nāo sö da sua experiência, observaçāo e sensibilidade, mas também de pesquisa histórica e cultural. Sinto-me viajando pra esse país exótico, fascinante e diferente de tudo o que conheço.
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Muito obrigado!
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