Quênia e Tanzânia – Hakuna Matata!

Nairóbi, o começo ________________________________

Waltz For Ruth, de Pat Metheny, álbum Beyond the Missouri Sky (Short Stories), com Charlie Haden

Sei lá por que motivo eles nascem com dentes tão brancos que parecem saídos de uma seção de clareamento. Assim era Vincent – o elegante e simpático queniano que nos recebeu no aeroporto de Nairobi.

– Jambo!, disse ele em swahili e sem economizar sorrisos. Parecia orgulhar-se deles. E nem na simpatia se conteve. Este sentimento de afinidade mágico, que atrai e identifica as pessoas imediatamente, é uma sensação espontânea que levou-me a estabelecer uma certa harmonia com ele. Longe de criar laços de amizade, mas boa, que se repetiria em novos encontros na Capital e no meio da viagem. Logo ali estabeleceu-se o tom do que seria – ainda sem sabermos – a nossa relação com os demais quenianos e tanzanianos que encontraríamos ao longo de toda a jornada.

 Passava das duas da manhã quando pisamos no chão do país das Acácias. Do dia seguinte que saí de casa, às 3 da tarde! O cheiro e a temperatura na madrugada eram frescos, como se o ar da savana estivesse às portas do aeroporto. Embora o avançado da hora, não foi a alegria de em pouco tempo estar com chave do quarto do hotel o que me dominava, senão um grande alívio: ver nossa bagagem alojada e intacta nos três jipes. “Alojada”, aqui, é um eufemismo para atulhada.

No quarto do hotel, a expectativa parecia não me deixar pregar olho, a despeito de poucas horas faltarem para o Sol vir do Japão e nascer na África. Contudo, o tempo de olhos cerrados tentando atrair o sono não foi morto nem perdido, pois deitado no travesseiro do quarto escurecido, ocorreu-me editar na memória as primeiras palavras deste post. Palavras e frases. Também é nessas horas cinzentas que algumas inspirações me ocorrem, transformam pensamentos em escritas criativas. E como sempre, pensadas nos leitores caprichosos que um dia as lerão com cuidado, alguns até com o mesmo que dispensei a elas. As imagino, mas não as escrevo, imerso no meu universo de curtas sentenças e poucas palavras, dado à minha falta de erudição acerca do Quênia e da Tanzânia, por suposto. Foram bem cuidadas, contudo. Um caminho que julgo indispensável para não escrever besteiras. E foi com elas que o sono me pegou.

Logo partiríamos rumo às reservas de Samburu e Buffalo Springs, sete horas de viagem de Nairobi ao destino, 304 km metidos num jipe, sem conforto, mas carregando um grupo que conectara-se tão bem desde o primeiro instante que tudo converteu-se em satisfação. Com paradas pelo meio para comida e outras necessidades, os doze brasileiros de São Paulo, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Minas Gerais, Pará, Distrito Federal e Rio de Janeiro, liderados pelo paulistano Marcio Lisa – às nove da manhã, respeitando o briefing, reuniu-se no desjejum à espera da hora de sairmos para resolvermos questões práticas, como troca de moeda, compra de petiscos para a viagem, garrafas de vinho sul-africano e coisas pessoais de cada um. Dormimos mais uma noite, entramos no fuso horário e a partir da manhã seguinte entramos em nossos três Land Cruisers, veículos que por 16 dias seriam nossos cárceres privados. A capital foi abandonada para seguirmos o roteiro em direção ao norte do país.

Os carros, 4×4, estilo safári, onipresentes na África subsaariana, têm três sequências de bancos, teto retrátil, cooler e um garrafão de água mineral com bomba para enchermos nossas garrafinhas. Alternávamos entre nós os lugares, e embora neste trecho a maioria das estradas fossem de asfalto, para mim, a sensação logo convertera-se em desconforto, um anúncio do que seriam os próximos dias percorrendo os parques nacionais e estaduais durante os game rides. Conduzidos pelos melhores motoristas que poderíamos esperar: Wiki, Kaled e Oburu. E ainda não sabíamos o quanto conheciam da fauna e flora de cada um dos parques e reservas por onde passaríamos. Em resumo, a viagem prometia!

Dois mil quilômetros ao todo, muita aventura por um oceano sem limites de pradarias nesse microcosmo da África. Preocupação nenhuma, a não ser o foco no dia, porque há muito o que saborear entre experiências e encontros. Chances de algo dar errado sempre há, nos advertiu o guia. “Como em qualquer viagem, mas nada com que devamos nos preocupar”, concluiu. “Uma atolada aqui, outra ali”, Márcio ia relembrando-se de perrengues passados e nos preparando para o futuro.

A expedição pelo Quênia e Tanzânia partiu então da capital em direção às Reservas de Buffalo e de Samburu, num sábado ensolarado, rumo ao estado de Laikipia, no planalto central do Quênia, cuja paisagem do percurso ia de paisagens de cerrado a pequenos vilarejos com barracas de legumes, frutas e verduras à beira, animais domésticos, gado e gente à beira. Era o país nos sendo apresentado às janelas.

 Chegamos ao Samburu após percorremos alguns poucos quilômetros de estrada de chão batido e poeirento já dentro do parque, até desembarcarmos no simpático Simba Lodge. Tudo o que queríamos era descanso, um banho renovador e uma cama cujo conforto certamente seria uma abundância comparada à dos jipes.

Voltarei para contar.

Mambo jambo!

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15 comentários em “Quênia e Tanzânia – Hakuna Matata!

  1. Arnaldo com seu dom para traduzir em palavras tudo o que viu e sentiu durante suas viagens, repete aqui esse breve e conciso relato do que também vivi e presenciei na sua companhia e de outros inesquecíveis amigos de viagem. Esperamos os próximos capítulos.

    Rogerio Braga

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  2. Arnaldo, você trouxe a minha memória lindas lembranças da viagem maravilhosa que fizemos, e das pessoas que tive o prazer de conhecer.
    Marta Matias

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  3. Que belo relato Arnaldo. Sua forma de escrever é singular. Como participante da aventura, revivi esse trecho da viagem. E imagino que despertará a curiosidade dos leitores que ainda não estiveram lá. Já estou curiosa pelos próximos capítulos.

    Curtido por 1 pessoa

  4. Ahhh simplesmente sensacional!
    Parabéns 👏 👏
    Que privilégio poder ter acesso a esse maravilhoso relato, de uma viagem cinematográfica!
    “Ou a vida é uma grande aventura ou não é nada” (Hellen Keller)
    Ansiosa pelos próximos capítulos!

    Grande abraço 🌺

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  5. Essa viagem deve ter sido uma delícia! Nos fez recordar nossa viagem ao Serengeti. Obrigado por compartilhar esses momentos e traduzi-los com tanta sensibilidade.

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